Oito Séculos de Delírios Financeiros - Desta vez é diferente!

O livro Oito Séculos de DelíriosFinanceiros – Desta vez é diferente dos economistas Carmen M. Reinhart e Kenneth S. Rogoff compilou dados sobre crises financeiras de todos os países do mundo nos últimos 800 anos. O livro tem 457 páginas, das quais 168 (37%) são apêndices e tabelas de dados para quem quiser replicar os resultados.



O livro se divide em seis partes. Na primeira parte, que explana sobre conceitos básicos. Os autores definem crise financeira por duas maneiras:  por meio de limiares quantitativos (isto é, por meio de números, como inflação, choques cambiais e deslastres); e por meio de eventos: crises bancárias, calotes externos e internos.

Os autores também lançam o conceito de crises seriais. Assim como serial killers  são pessoas que constantemente matam, esses países caloteiros seriais (entre eles, todos da América Latina) constantemente entram em crises financeiras e deixam de honrar suas dívidas.

Nós estamos acostumados a pensar que esses caloteiros estão apenas nas economias em desenvolvimento, como a nossa. Mas, vendo de uma perspectiva de 800 anos, nota-se que vários países, hoje desenvolvidos, já foram caloteiros seriais. Países em situações complicadas podem, sim, evoluir e ser promovidos a bons pagadores, mas os autores alertam que esse “não é um processo rápido e fácil”.

O motivo do subtítulo irônico do livro “Desta vez é diferente!” é porque todas as crises apresentam padrões financeiros muito semelhantes. Mesmo assim, as pessoas daquela época sempre acharam que com eles não aconteceria uma crise, porque “desta vez é diferente”, desta vez, tem isto ou aquilo de diferente. Por exemplo, uma tecnologia nova, como aconteceu na crise das “.com”.

O método dos sinais (ou a maioria dos métodos alternativos) não fornece a data exata em que a bolha estourará nem proporciona a indicação óbvia da crise iminente.

Mas ele comprova que existe uma crise iminente! No caso brasileiro, esse método já apontava uma crise iminente antes do final do governo Lula. Ou seja, independentemente de quem ganhasse as eleições de 2012, esse candidato enfrentaria uma crise grave. Entre esses indicadores de crise, um dos principais era o crescimento da dívida pública.

Mas o que é uma dívida pública? Dívida pública é uma dívida que um país contrai para financiar suas atividades e projetos. Quando você quer fazer algum negócio, você vai ao banco, pega um empréstimo e vai pagando as parcelas. Um país, Estado ou município faz a mesma coisa. Note que ninguém é obrigado a ir num banco pedir um empréstimo, no caso, um governo também não é. Ele vai porque decidiu que algum projeto é necessário para suas populações.

Na minha opinião, nossos últimos governos fizeram muitos projetos que dão ou darão prejuízos e não eram necessários. Para citar alguns: a maioria dos estádios para a Copa do mundo, transposição do Rio São Francisco, usina de Belo Monte (não vou nem entrar nas questões ambientais, atenho-me apenas a parte financeira, cuja viabilidade é questionável), entre muitos outros que podem nem ter chegado a público . Além disso, o governo investiu em fusões e aquisições de grandes empresas como Ambev, JBS e Grupo X de Eike Batista. Todas essas dívidas, na minha opinião, não se reverteram em nenhum benefício visível para a população brasileira, mas contribuíram significativamente para a crise que estamos enfrentando e terão que ser pagas (com o nosso suor).  Infelizmente, só vejo os programas sociais como Bolsa Família e Minha Casa, Minha Vida serem lembrados como causadores da dívida pública.

Ao mesmo tempo que o governo aumentou as dívidas públicas com projetos, no mínimo, questionáveis,  a entrada de dinheiro diminuiu. Basicamente por dois motivos. Um deles estava nas mãos do governo e era a lei do petróleo. Isso é claramente explicado nos últimos capítulos do livro Bilhões e Lágrimas - A economia brasileira e seus atores. O outro motivo não estava nas mãos do governo, mas deveria ser previsto por ele, que foi a baixa nos preços de commodities.

Voltando a uma citação direta do livro Oito Séculos de Delírios Financeiros: “A maior barreira ao sucesso [deste método de previsão para crises] é a tendência arraigada dos formuladores de políticas e dos participantes do mercado de tratar os sinais como resíduos arcaicos irrelevantes de condições estruturais ultrapassadas, presumindo que as velhas regras de avaliação já não mais se aplicam.”.

Dado o contexto a que chegamos, não existem soluções fáceis. A presidente Dilma não é uma governante inapta. Só uma intercessão sobrenatural poderia evitar que o Brasil passasse pela crise atual. Os alicerces dela já estavam lançados desde 2010. O governo interino parece sinalizar que tomará as medidas cabíveis, isto é, cortar todos os gastos possíveis (Saúde e Educação entre eles) e, talvez, aumentar impostos (segundo declaração do ministro da Fazenda Guido Mantega há dois dias). Isso será suficiente? Talvez, sim. Mas acredito que seja necessário contar com uma alta das commodities (o que não depende do governo) também, ou seja, contar com um pouco de sorte. Existe uma outra maneira  de solucionar o problema na perspectiva do governo (que, ao meu ver, é criminosa com a população). Essa solução é elevar a inflação intencionalmente para níveis astronômicos, o que já foi feito por governos muito anteriores. Caso haja interesse, explicarei em outros posts como isso é possível e como é feito.

Uma proposta que gostaria de ver implementada a, alinhada com a conclusão dos autores de Oito Séculos de Delírios Financeiros, é a criminalização do descontrole da dívida pública. Um governante que aprovasse projetos que comportem a dívida pública deveria ser punido legalmente por isso.  Uma decisão ruim nesse âmbito prejudica a vida de milhões de pessoas por décadas. Ninguém poderia fazer isso e sair impune.

Boa semana! Bom trabalho! Boas Leituras!

Trabalhe e pense em crise, sim.  Mas pense com clareza!*


*Alusão à frase fixada em vários outdoors pelo país com logotipo oficial do governo interino. Será que ele não pagou mesmo nada por ela?

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