Como acabei perdendo meu coração - Doris Lessing (Nobel de Literatura em 2007)


A autora...

Doris Lessing nasceu Doris May Tayler em 1919, na Pérsia, atual Irã. Seus pais eram britânicos, de quem ela herdou a cidadania. Seu pai era um veterano da Primeira Guerra e foi para lá trabalhando no Banco Imperial da Pérsia, sua mãe era enfermeira.

Quando Doris tinha 8 anos, seus pais decidiram se mudar para a Rodésia (atual Zimbábue) para tentar um empreendimento agrícola que não deu certo. Lá eles a colocaram num colégio de freiras, mas Doris abandonou a educação formal aos 14 anos e passou a viver de trabalhos free-lancer, entre eles, como escritora.

Aos 18, em 1937, Doris se casou com um jovem operador de telefone, com quem teve um casal de filhos.  Ela se divorciou 5 anos depois. Aos 26, ela conheceu o ativista político, exilado por ser judeu alemão, Gottfried Lessing, com quem permaneceu casada por 3 anos e teve um filho.

Aos 30, após dois divórcios, ela se mudou para a Inglaterra, deixando os dois filhos do primeiro casamento na África do Sul e levando o filho mais novo com ela.

A partir daí, Doris Lessing se dedicou integralmente à literatura, o que culminou com o Prêmio Nobel em 2007. Ela foi a 11ª mulher a ganhá-lo (atualmente a contagem está em 14, clique aqui para saber mais) e a pessoa mais idosa a recebê-lo.

Segundo a Academia Sueca, responsável pelo prêmio, Doris Lessing é:

“a contadora épica da experiência feminina, que com cepticismo, ardor e uma força visionária, escrutinou uma civilização dividida.”

Segundo Doris, ela ganhou o prêmio porque:

“Tenho 88 anos e eles não podem dar o Nobel para um morto, então acho que eles pensaram que era melhor me dar logo antes que eu batesse as botas.”

Entre os fatos relevantes, Doris Lessing foi proibida de entrar na África do Sul e do Zimbábue durante o apartheid, por ser publicamente contra o regime. E ela recusou o título de Dama do Império Britânico (concedido pele Rainha da Inglaterra), porque, segundo Doris, o Império Britânico não existia mais.

Doris Lessing teve um derrame em 1990, que a deixou impossibilitada de viajar, e morre em 2013, aos 94 anos. Ela faleceu depois de seus dois filhos, deixando apenas uma filha que morava na África do Sul. Doris Lessing nos agraciou com uma bibliografia extensa e riquíssima. Vale muito a pena conhecer sua obra.

O livro...

Acabo de ler o livro O Quarto 19. Uma coletânea de contos da autora. Ela tem uma linguagem simples e fácil de ler, que, ao mesmo tempo, penetra o íntimo de cada personagem, principalmente, das figuras femininas. Entre os contos que mais me marcaram estão A Outra Mulher e Quando acabei perdendo meu coração.


Segue um pequeno trecho do segundo conto:

“Seria fácil dizer que tomei uma faca, abri meu peito com um talho, tirei lá de dentro meu coração, e joguei-o fora; mas, infelizmente, não foi assim tão simples. Não que eu, como todo mundo, não tivesse querido muitas vezes fazer isso. Não, aconteceu de maneira diferente, e não como eu esperava.

Foi logo depois de eu ter almoçado e tomado chá, sucessivamente, com dois homens diferentes. Com meu companheiro de almoço eu tinha vivido durante (mais ou menos) quatro anos e sete meses. Quando ele me deixou por novos amores, passei dois anos, ou foram três?, meio morta, e meu coração tornou-se uma pedra, um peso impossível de carregar, levando em conta tudo o mais que pesa sobre uma pessoa. Então, lentamente e com dificuldade, libertei-me, porque meu coração conservava, com carinho, mil adesões ao meu primeiro amor – embora, de outro ponto de vista, ele pudesse ser legitimamente considerado como seu segundo verdadeiro amor (sendo meu pai o primeiro) ou meu terceiro (interpondo-se meu irmão).

Segundo a canção folclórica:

Só três homens amei na vida,
Meu pai, meu irmão, e o homem que
Me tirou a vida.

Entretanto, se alguém julgasse superficialmente, poderia considerá-lo (talvez, não me lembro mais) como o décimo terceiro, mas isso significaria desconsiderar a verdade emocional íntima. Pois todos sabemos que os casos ou envolvimentos que temos entre amores sérios, embora possam ser numerosos e abranger anos e anos, realmente não contam.

Essa maneira de encarar as coisas torna uma porção de gente infeliz, pois é sabido que (...)”

Muito obrigada por seguir o nosso blog. Por favor, fique à vontade para postar seus pensamentos, dúvidas, sugestões ou críticas.


Boas leituras! Bom domingo!

Comentários

  1. Olá!! Passo aqui para agradecer pela resenha. Tenho um tempo tentando comprar Quarto 19 mas não acho. Só achei com valores enormes (189,0 reais na estante virtual), mas a sua resenha me deixou contente porque consegui ler um trechinho do livro. Espero poder comprar em algum momento! Parabéns pelo blog

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    1. Oi, Beatriz. Eu que agradeço pelo feedback positivo. Isso me faz muito bom. O exemplar que eu li ficava em uma pequena biblioteca do meu departamento, que a secretária estava cuidando. Um dia, infelizmente, eu fui recomendar a uma outra colega e não encontramos mais um livro. É uma pena que traduzam e publiquem tão poucas mulheres que ganharam o Nobel. Mas é importante falar delas e procurar os livros. Fazemos a nossa parte! Continuamos a luta!

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