O QUE VEIO NA MALA, ALÉM DA VONTADE DE UM BRASIL MELHOR?
Localização do Chile e principais cidades. |
O Chile é um país sul-americano que,
assim como o Equador, não faz fronteira com o Brasil. Lá se fala o espanhol,
pois foi colonizado pela Espanha. O país tem uma História muito parecida com o
Brasil em alguns aspectos, por exemplo, os dois passaram por um período
ditatorial na década de 70.
RELEMBRANDO A DITADURA BRASILEIRA
Ranieri Mazzilli. O presidente esquecido. Seria o futuro de Temer? |
A ditadura brasileira foi de 1964 até
1985. Oficialmente houve seis presidentes durante este período, um civil e
cinco militares [3]. O primeiro presidente foi o civil Ranieri Mazzilli.
Eu achava que eu entendia bastante de História do Brasil, eu nunca, nem sequer,
tinha ouvido esse nome ser pronunciado [4]. Na prática, era uma junta militar
que governava, mas era o senador que ocupava o cargo de presidente da
República. Lembrou um pouco o Temer hoje em dia...
Voltando ao assunto, os demais
presidentes foram os generais Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-67), Artur Costa e Silva (1967-69), Emílio Garrastazu Médici (1969-74), Ernesto Geisel
(1974-79) e João Figueiredo (1979-85). Relembre o nosso
texto sobre as mulheres dos nossos ditadores que não eram belas, nem recatadas,
muito menos, “do lar”, clicando aqui.
Além disso, uma junta militar composta pelas três forças militares que governou
o Brasil em 1969, os oficiais comandantes eram Aurélio Lira Tavares (Exército), Márcio Sousa e Melo (Força Aérea) e Augusto Hamann Rademaker Grünewald
(Marinha).
Durante esse período o Brasil teve
três moedas, fruto de três planos econômicos que não deram certo, mas devido à falta de criatividade para nomes, as moedas se chamaram
cruzeiro (1942-67) [5], cruzeiro novo (1967-70) [6] e cruzeiro (1970-86) [7]. Que
terminou num cenário de superinflação e crise econômica durante a volta à
democracia.
RECOMENDAÇÕES PARA QUEM QUER SABER
MAIS!
Para quem quer saber mais sobre como
foi o começo da ditadura no Brasil, o blog recomenda a leitura do livro Antes
do Golpe – Notas sobre o processo que culminou no golpe militar de 1964
do escritor Ferreira Gullar. O autor viveu este momento e relata em primeira
pessoa. Para mim, que nasci em 1986, é um pouco estranho ver figuras como José
Serra, exercendo a presidência da União Nacional dos Estudantes (UNE) [8]. O
político fez uma transição ideológica muito drástica ao longo de sua carreira. Uma
leitora do blog comentou que também não sabia que as forças armadas americanas
tinham mandado torturadores profissionais para formar os torturadores
brasileiros. Na escola onde estudei, isso era um fato tão banal e comentado,
que eu imaginava que todo brasileiro soubesse [9].
ENQUANTO ISSO, NO CHILE...
Enquanto isso, a ditadura no Chile foi
de 1973 até 1990. Ou seja, ela começou 9 anos depois que a brasileira e durou
oficialmente 5 anos a mais. Faz-se uma ressalva, pois, as eleições de 85 no
Brasil foram indiretas. As primeiras eleições diretas no Brasil foram em 89 e
no Chile em 90. Oficialmente, considera-se que a ditadura no Brasil durou 21
anos, mas, se fosse contado como no Chile, durou 25. Lá durou 17. Durante todo este período,
apenas um homem governou o Chile, o general Augusto Pinochet [10].
Sim, estudar História no Chile deve ser
muito chato. Enquanto o blog teve que citar nove governantes para dar uma
breve descrição da ditadura brasileira, lá só teve um, Pinochet. Ele foi
julgado e condenado depois da volta à democracia e já morreu. E,
surpreendam-se, o Chile não criou nenhuma moeda nova neste período, apesar de
terem enfrentado um período de forte inflação e crise econômica, assim como o
Brasil. Aparentemente também houve apoio das forças norte-americanas na para
formação de torturadores por lá também, conhecida como Operação Cóndor [11].
RECOMENDAÇÕES PARA QUEM QUER SABER
MAIS!
Recomendação de leitura. |
A tomada do poder pelo general Pinochet
é um dos episódios mais dramáticos da História da América Latina. O escritor
chileno Roberto Bolaño no livro Estrela
Distante faz seu protagonista (um menino ainda) descrever que chorou quando
viu o Palácio de La Moneda (sede do
governo) sendo bombardeado, as tropas invadindo o palácio e matando o
presidente eleito. É realmente um evento para filmes. No Netflix é possível
assistir ao filme Allende em seu
Labirinto, descrevendo os últimos momentos do presidente dentro do palácio.
Vale a pena assistir ao filme, se você não sabe o que foi o evento, mas, ainda
assim, o filme ainda não transmite a brutalidade e a emoção do momento. Isso
nunca aconteceu no Brasil. Imagine um presidente eleito dizendo algo, como: “Eu
só saio daqui morto.” e as tropas invadindo e matando. Algo que marca a
História de um povo. Principalmente considerando o sofrimento que veio depois.
Recomendação de Filme. |
O livro que melhor descreve o
sofrimento da população civil (de direita e de esquerda, pois todos sofreram) durante
a ditadura é A
Casa dos Espíritos da escritora Isabel Allende, que é sobrinha neta do
Allende presidente. Esse livro deveria ser lido em todas as escolas da América
Latina, pois ele transmite eventos que foram similares em todos os países. É interessante
destacar que os dois escritores chilenos Roberto Bolaño e Isabel Allende
chegaram a se criticar publicamente por terem opiniões divergentes, mas, em
ambos os livros, tanto Estrela Distante,
quanto A Casa dos Espíritos, os
autores têm uma percepção muito negativa do regime ditatorial. Nenhum deles
achou que foi bom nem que “a gente deveria voltar para aquilo de novo”.
Super Recomendação de Leitura. |
OS ANOS SE PASSARAM. A DEMOCRACIA
VOLTOU. COMO OS DOIS PAÍSES EVOLUÍRAM?
Bem, o salário mínimo no Chile é
atualizado sempre no dia 1 de julho de cada ano. Em 2017, o reajuste aprovado é que o salário
atinja 270.000 pesos chilenos [1]. Considerando a cotação de sexta (26), isso
equivale a R$ 1309,94 [2]. Lembrando que no Chile a carga horária é de 45 horas
semanais e só se pode trabalhar se você for maior de 18 e menor de 65 anos. No
caso do Brasil, o salário mínimo é reajustado todo dia 1 de janeiro. Em 2017,
ele foi reajustado para R$ 937,00, isso é quase 30% a menos do que o Chile. A
carga horária é de 44 horas e não existe limite oficial para se parar de
trabalhar. As leis trabalhistas estão sendo alvo de muito debate atualmente e,
segundo a opinião de alguns, elas podem prejudicar ainda mais a classe
trabalhadora.
Um cidadão chileno não precisa de visto
para entrar nos Estados Unidos. O Chile, ao contrário do Brasil, tendeu a
adotar uma política econômica mais liberal, que valoriza a inciativa privada.
Mas, e esse mas é importante, nunca deixou de garantir os direitos dos
trabalhadores e de classes mais desfavorecidas. Parece que a herança do Allende
morto dentro do palácio de governo, sempre deixou seu “pezinho” nas políticas
econômicas do Chile. É impossível esquecer aquilo. A taxa de desemprego lá é
quase zero, na prática, os trabalhadores sempre ganham mais que o salário
mínimo. O PIB cresce seguidamente, mesmo sendo um país exportador de
commodities como o Brasil. A economia chilena é dependente da exportação do cobre,
peixe, papel e vinhos [12].
POR QUE O CHILE É UM BRASIL QUE DEU
CERTO?
Na visão do blog, porque o governo
chileno sempre tomou decisões visando ao longo prazo. Eles traçam um plano de
governo, e independentemente de quem seja o presidente, ele ou ela tem que
seguir. O que acontece é que o presidente pode dar um “toque de gestão” mais a
direita ou mais esquerda. Ele ou ela não pode achar que a casa é “dele” ou “dela”
e, da noite para o dia, sair por aprovando medidas que vão contra o plano de
governo eleito, como a aprovação da terceirização da atividade fim e a volta da
Vaquejada [13].
A ênfase no gênero se deve ao fato de
que atual presidente do Chile é Michelle Bachelet (desde 2014). Anteriormente,
ela foi presidente entre 2006 e 2010. O partido de Bachelet tem uma visão mais
de esquerda. No entanto, ela não conseguiu eleger um sucessor. Entre 2010 e
2014, o presidente do Chile foi Sebastián Piñera, com um governo mais de
centro-direita (com quem este blog se identifica mais). É interessante
ressaltar que o plano do Chile não mudou de rumo drasticamente por causa de um
presidente de esquerda e outro de direita. A visão de longo prazo continuou
sendo a mesma.
MICHELLE BACHELET: UMA HISTÓRIA DE
SUPERAÇÃO PESSOAL EXTRAORDINÁRIA!
Eu estava na sexta série da Escola
Municipal Machado de Assis em Ituiutaba, interior de Minas Gerais (enfatizo esse
fato para mostrar que escolas públicas de qualquer Estado podem ser
boas), quando a minha professora de História (acho que o nome dela era Edna)
contou que uma política chilena (naquela época, a gente nem imaginava que ela
seria presidente) tinha sido estuprada e torturada durante dias, porque o pai
dela era general do Exército chileno e tinha se recusado a apoiar o Pinochet. O
pai dela morreu durante a tortura, ela e mãe sobreviveram. A descrição da
tortura de Michelle é uma das coisas mais terríveis que eu já ouvi na vida.
Segundo a minha professora de História, anos se passaram (décadas!), a democracia
voltou, começaram a processar e prender torturadores, mas o torturador de
Michelle se escondeu. Um dia ela chamou o elevador do prédio onde morava, e
quem estava lá dentro? Isso mesmo. Eles moravam no mesmo prédio! O sujeito foi
pego, processado, condenado e preso. Segundo notícias mais recentes, parece que
ele foi solto este ano. Para mim, esse é o maior exemplo de uma volta por cima.
Ela deu uma entrevista para revista Marie Claire em 2012. “Eu
não pensava em roupas. Tentava mudar o país”. Pessoalmente, discordo da
maioria das posições de Bachelet, mas é impossível negar que é uma atitude de
vida admirável. Marcou muito a minha juventude.
NEM TUDO SÃO FLORES NO CHILE:
PREVIDÊNCIA
Este blog gosta de recomendar a leitura
do artigo 10
motivos que provam que o Chile é o Brasil que deu certo. É um texto
escrito há 5 meses, nós não conhecemos o autor e não ganhamos nada pra divulgar
este artigo. Mas nós concordamos com a visão e achamos que vale muito a pena
lê-lo. Leia! No entanto, já é possível fazer uma ressalva, e essa ressalva é
justamente sobre o primeiro motivo: previdência. O Chile foi o primeiro país do
mundo a privatizar sua previdência e, segundo reportagem da BBC, agora eles
estão enfrentando sérios problemas com isso [14].
O QUE VEIO NA MALA, ALÉM DA VONTADE
DE UM BRASIL MELHOR?
Além da vontade de um Brasil igual ao
Chile, vieram três livros nesta viagem. Por la Humanidad Futura (Pela
Humanidade Futura), antologia política da escritora chilena Gabriela
Mistral. Ela foi laureada com o Nobel de Literatura em 1945, até hoje ela é a
única mulher sul-americana a receber essa premiação. Desconheço totalmente a
existência de alguma tradução da obra dela para o português e não deve ser
porque espanhol é uma língua muito diferente da nossa e é muito difícil de ser
traduzido. Por isso, infelizmente, se você quiser ler Gabriela Mistral, precisa
ser no original. Outro mito que foi quebrado é que aqui, quem conhece Gabriela
Mistral normalmente se refere a ela como uma “poetisa” chilena e cita o poema “Corderito”,
que ela escreveu para os filhos. Ninguém ganha o Nobel com aquilo, por mais “fajuta”
que seja a premiação do livro. É um poema igual aos que o Michel Temer escreve.
Você, leitor do nosso blog, escreveria algo melhor que aquilo. Lendo o prefácio
do livro Por la Humanidad Futura, o
que eu descubro? Que Gabriel Mistral publicou 6 livros de poesia na vida e não
se sabe quantos artigos políticos (alguns se perderam), estima-se que mais de
700. Agora começou a fazer algum sentido o Nobel.
O livro Viña del Mar (publicado em 1946) vai para a coleção de livros antigos, assim
como as lembranças de Portugal (relembre as aquisições da Livraria Sá da Costa
clicando aqui).
Ele narra a História da colonizaçãog da região litorânea central do Chile.
Cuentos
Mapuches de Chile (Contos Mapuches do Chile) é
uma coletânea dos contos tradicionais indígenas. Os povos Mapuches lutaram
muito para preservar sua cultura, hoje eles são cerca de um milhão de pessoas.
[15] O Chile pareceu, aos olhos de uma turista desavisada, um país livre de
racismos contra índios e negros.
Muito obrigada a todos vocês que leem e
seguem o nosso blog e aguentaram essa ausência de quase quinze dias. Mês que
vem, faremos outra viagem, dessa vez para Grécia. Por favor, fiquem à vontade
para deixar críticas e sugestões literárias para melhorarmos nossas viagens
tanto físicas, quanto mentais e espirituais.
Boa Semana! Boas Leituras!
Referências
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